Asas foram concedidas por Deus para que os seres que as possuem voem para a liberdade. As minhas asas foram concedidas pela magnitude esplêndida da literatura, em busca da supra realidade. -Karina L.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Depreciável Luxúria - CONTO

O espelho refletia lábios fartos cor de cereja. Deslumbrante, pensou. Seu colar de pérolas reluzia sob o colo.
Decote provocante, maquiagem impecável, scarpin vermelho salto agulha, favoreceu pelo menos uns cinco centímetros. Bolsa Chanel, perfume doce. Suficientemente provocante? Acreditou que sim. Nunca esteve tão elegante! A noite teria que ajudá-la.
Ao sair, foi envolvida pelo glorioso crepúsculo. Uma enorme e saciada lua tingia o céu escuro iluminado por vários pontos incandescentes, estrelas que pareciam observar sua travessura. Calor escaldante! Adorava noites de verão, podia abusar dos decotes, diferentemente do inverno que era obrigada a sair toda empacotada. Pelos menos ela era constantemente elegante.
Dirigindo, resolveu acender um cigarro, aproveitou o sinal vermelho. Aquele ponto sempre pareceu eterno e ininterruptamente acumulava filas de carros. Comprovou o fato ao olhar pelo retrovisor.
Verde.
Seguiu rumo à deliciosa aventura. Estava com sede, muita sede, que não tarde se saciaria com uma bela dose de Martini. A excitação se apoderou de sua pele e ansiosa permaneceu até provar de bom grado a ardente bebida.
Havia marcado naquela boate pois ambos gostavam. O calor, as bebidas, a música, tudo ali era demasiadamente atrativo. Depois de curtir a perfeita e calorosa noite de verão iria se aventurar entre os braços fortes de sua paixonite. Isso! Estava apaixonada e não obstante necessitava de muito sexo e amor.
Frenética, varreu o ambiente com atento olhar a procura de sua cobiça. Avistou o corpo másculo inerente detestando o que viu. Parecia que o demônio encarnado da própria luxúria havia começado a festa sem ela. Aos beijos com uma minúscula oriental, a noite no mínimo deveria estar aprazível para aquele infame.
Com uma indescritível jactância, caminhou até o bar e pediu seu Martini. Engoliu com sofreguidão a ardente bebida, naquele instante não parecia prazerosa, mas sim ávida. Acendeu um cigarro e tragou com força.
Filho da puta! Tem feito isto nos últimos dois meses? Não era possível. Então por que aceitou sair com ela naquele dia? Por que a trairia sabendo que estava prestes a chegar? Não conseguia digerir. Estavam juntos a menos de dois meses, mais e daí? Nunca ficou claro que seria um relacionamento aberto, não que ela quisesse ter algo sério também, mas fidelidade não é pedir demais. Tendência humilhante e deplorável esta de ficar se martirizando.
Pensando, chegou à conclusão de que estava deslumbrante, olhou ao redor e o que não faltava era homens gostosos. Deu a última tragada. Resolveu caçar. Achou sua presa e logo partiu para o ataque numa missão nada difícil.
Minutos depois sentiu a pressão em seu braço. Era o desgraçado. Com uma audácia infinita agarrou-a pelo pulso fazendo-a cambalear e atingiu com um soco seu companheiro momentâneo. Reclusa viu formar a confusão ao seu redor. Socos, gritos e uma pessoa deplorável completamente alterada pelo álcool.
Só conseguia sentir vergonha pela situação. Se permanecesse ali, quem apanharia seria ela. Lamentou pela presa fácil nos bíceps volumosos do canalha.
Tomou coragem e saiu à deriva ruborizada. Não demorou a entender que só tinha a perder em aventuras noturnas e questionou se compensaria investir em relacionamentos soturnos de baladas. Sua integridade ponderou veemente e lhe respondeu que não.

Amor entre morte

É pecado imaginar a morte?
Sim! A minha morte?
Seria pecado pensar se sentiria meu luto?
Seria pecado desejar assistir nos bastidores o suposto sofrimento?
Quem disse que sofreria?
Você têm duas casas.
Uma divertida, outra confortável.
Você choraria minha morte em qual delas?
Você ousaria de tal pena nos ombros de quem?
Você recordaria nossos poucos momentos?
Você sofreria com o saudosismo? Ou viveria com lembranças fragmentadas?
Você deixaria minha imagem se dissipar?
Você pensaria em outra pessoa no meu lugar?
Você trocaria a terra pelo paraíso comigo?
Duvido!
Você deve pensar que têm muitas coisas para viver.
Soltaria minha mão? Ou choraria com sofreguidão?
Pediria aos céus meu regresso? Ou desejaria seguir meus passos?
Seria loucura pedir um filme futuro de tudo isso?
Assistir fora de meu corpo sua reação? Cada ato?
Seus joelhos sobre a grama verde, onde jaz meu corpo pálido.
Seria bonito observar? Causaria emoção por sofrer por mim?
A morte não pode ser bela. A morte não pode ser uma prova de amor.
Ela não nos presentearia nem com o mais belo teatro.
Não seria um brinde.
Não consentiria tamanha felicidade.
Sim! Felicidade!
Pois assim veria o quanto se importa.
Precisaria ser assim? Em duras penas?
Precisaria provar desse fruto amargo?
Permitir que meus pensamentos cheguem a tal ponto,
desejar assistir minha própria morte,
para alcançar os laços supremos do amor.
Nada disso importa!
No fim o tempo apaga tudo.
Se vou, você fica...
Seu coração bate, o meu não.
Você agradece um dia de sol.
Na morte, não há sol!
Em vida se contempla o arco-íris e o cheiro da chuva.
O que há na morte?
Você me esqueceria a cada sorriso e conquista de seus filhos.
O luto duraria apenas uma semana, quem sabe mais.
O que prevaleceria?
Uma alma a deriva no desconhecido eterno...
Sem prova alguma de seu amor.
 
©2007 '' Por Elke di Barros